Chama-se Dor.
Revela-se na desventura do amante,
na desolação da orfandade, na angústia da miséria, no alquebramento da saúde,
no esquife do ser querido que se foi deixando atrás de si a lágrima e o luto,
no opróbrio da desonra, na humilhação do cárcere, no aviltamento dos
prostíbulos, na tragédia dos cadafalsos, na insatisfação dos ideais, na
tortura das impossibilidades – no acervo das desilusões contra que se
confunde e se decepciona o coração da Humanidade.
Não obstante, a Dor é a grande
amiga a zelar pela espécie humana, junto dela exercendo missão elevada e
santa.
Estendendo sobre as criaturas suas
asas, úmidas sempre do orvalho regenerador das lágrimas, a Dor corrige,
educa, aperfeiçoa, exalta, redime e glorifica o sentimento humano a cada
vibração que lhe extrai através do sofrimento.
O diamante escravizado em sua
ganga sofre inimagináveis dilacerações sob o buril do lapidário até poder
ostentar toda a real pureza do grande valor que encerra. Assim também será a
nossa alma, que precisará provar o amargor das desventuras para se recobrir
dos esplendores das virtudes imortais cujos germens o Sempiterno lhe decalcou
no ser desde os longínquos dias do seu princípio!
A alma humana é o diamante raro
que a Natureza – Deus – criou para, por si mesmo, aperfeiçoar-se no desdobrar
dos milênios, até atingir a plenitude do inimaginável valor que representa,
como imagem e semelhança d’Aquele mesmo Foco que a concebeu. Mas o diamante –
Homem – acha-se envolvido das brutezas das paixões inferiores. É um diamante
bruto! (...)
Então o diamante – Homem – inicia,
por sua vontade própria, a trajetória indispensável do aperfeiçoamento dos
valores que consigo traz em estado ignorado, e entra a sacudir de si a crosta
das paixões que o entravam e entenebrecem.
E essa marcha para o Melhor, essa
trajetória para o Alto denomina-se Evolução!
A luta, então, apresenta-se rude!
É dolorosa, e lenta, e fatigante, e terrível! Dele requer todas as reservas
de energias morais, físicas e mentais. (...)
A Dor, pois, é para o Espírito
humano o que o Sol é para as trevas da noite tempestuosa: - Ressurreição!
Porque, se este aclara os horizontes da Terra, levantando com seu brilho
majestoso o esplendor da Natureza, aquela desenvolve em nosso ego os
magnificentes dons que nele jaziam ignorados: - fecunda a inteligência,
depurando o sentimento sob as lições da experiência, educando o caráter,
dignificando, elevando, num progredir constante, todo o ser daquele em quem
se faz vibrar, tal como o Sol, que vivifica e benfaz as regiões em que se
mostra.
A Dor é o Sol da Alma... (...)
Ela, a Dor, é o maior agente do
Sempiterno na obra gigantesca da regeneração humana! É a retorta de onde o
Sentimento sairá purificado dos vírus maléficos que o infelicitam! Quanto
maior o seu jugo, mais benefícios concederá ao nosso ego – tal como o
diamante, que mais cintila, alindado, quanto maior for o número dos golpes
que lhe talharem as facetas! É a incorruptível amiga e protetora da espécie
humana: - zelando pela sua elevação espiritual, inspirando nobres e fraternas
virtudes! Ela é quem, no Além-Túmulo, nos leva a meditar, através da
experiência, produzindo em nosso ser a ciência de nós mesmos, o critério
indispensável para as conquistas do futuro, de que hauriremos reabilitação
para a consciência conturbada. É quem, a par do Amor, impele as criaturas à
comiseração pelos demais sofredores, e a comiseração é o sentimento que
arrasta à Beneficência. E é ainda ela mesma que nos enternece o coração, fazendo-nos
avaliar pelo nosso o infortúnio alheio, predispondo-nos aos rasgos de
proteção e bondade; e proteger os infelizes é amar o próximo, enquanto que
amar o próximo é amar a Deus, pautando-se pela suprema lei recomendada no
Decálogo e exemplificada pelo Divino Mestre! (...)
Ó almas que sofreis! Enxugai o
vosso pranto, calai o vosso desespero! Amai antes a vossa Dor e dela fazei o
trono da vossa Imortalidade, pois que, ao findar dessa trajetória de lágrimas
a que as existências vos obrigam – é a glorificação eterna que recebereis por
prêmio!
Salve, ó Dor bendita, nobre e fiel
educadora do coração humano!
E glória ao Espiritismo, que nos
veio demonstrar a redenção das almas através da Dor!
León Denis / Yvone do Amaral Pereira
– Excertos extraídos da Revista Reformador de fevereiro/1978
|