Aqueles eram dias de intensa e imorredoura saudade.
Desde que morrera e ressuscitara, Ele voltou a enxugar as
lágrimas dos companheiros, a reconfortá-los, oferecendo-lhes combustível à fé
atormentada, que os reerguia, a pouco e pouco, da situação dolorosa que
experimentavam.
Tudo eram recordações inapagáveis.
Haviam retornado à Galileia conforme lhes fora
solicitado, mas a região querida não era mais a mesma.
Todos os lugares rescendiam a Sua ausência e
apresentava-se triste, sem qualquer encantamento.
Não podiam explicar a razão de tanto vazio existencial,
de falta de sentido para viverem.
Não sabiam, conscientemente, o tanto quanto O amavam.
A ausência dEle era insuportável. Não tinham ânimo para
os diálogos, como anteriormente, para as discussões e comentários habituais.
Ele fazia falta em tudo.
A vida sem objetivo é como um corpo sem oxigenação.
Ademais, não compreendiam, ainda não haviam absorvido
tudo que se passara, naqueles dias turbulentos de festas e de infortúnio.
Desde a entrada triunfal em Jerusalém até o domingo da
ressurreição, ultrapassava o seu entendimento, era enigmático.
As noites, antes iluminadas pelas Suas palavras, eram
agora sombrias, embora as estrelas fulgurassem no zimbório que os cobrira de
brilho no passado.
Foi num amanhecer em névoa junto à praia que Pedro O viu
e, aturdido, conversou com Ele.
– Atira as redes para a direita – Ele propusera e quase
rompeu-se o tecido da rede forte pelo número de peixes, após uma noite
cansativa e infrutífera… (João 21:11 e seguintes)
A alegria substituiu todos os anteriores
desencantamentos.
A felicidade cantava uma sonata de esperança nos seus
corações enquanto O ouviam falar. A mesma doçura e igual beleza em tudo que falava.
Nenhuma queixa nem reclamação, acusação alguma ou
qualquer lamento.
Ele falava do Reino nos corações e estimulava ao perdão e
ao amor sem limites.
As criaturas, Ele afirmava, estão doentes além da
ignorância que as domina e era necessário ter compaixão de todas, mesmo quando
sob o açodar de dores e perseguições, que desabariam sobre todos, em memória do
Seu nome e Sua mensagem.
As feras espirituais tinham fome de carne e sede de
sangue.
A noite do sofrimento seria longa, mas o amanhecer de
graças anunciava-se incomparável.
Pedia-lhes para que não resistissem ao mal e jamais
abandonassem o bem.
Suas ovelhas seriam sempre unidas, não importando que
fossem em pequeno número.
A morte pior para o ser humano é a defecção dos seus
deveres, o abandono da Verdade, ao invés de ser a do cansaço nas lutas.
*
O dia raiara brilhante e eles respiravam na praia, onde
comiam assados, peixes que lhes nutriam o corpo e a palavra dEle
sustentava-lhes o Espírito.
Depois, sem recordar-se que era Ele, sim, porém em corpo
espiritual, diluiu-se, fundiu-se na claridade das horas.
O júbilo voltou-lhes com o entusiasmo necessário para
falarem sem medo sobre a Sua ressurreição.
Ainda, no entanto, não sabiam o que fazer.
Continuaram juntos sempre que possível, aguardando.
Nesse comenos, numa tarde em que a brisa macia soprava
perfumada pelas flores silvestres, naquele monte próximo ao mar, numa paisagem
de magia pela sua beleza, estavam reunidas quase quinhentas pessoas e João,
inspirado, levantou-se e começou a narrar os últimos acontecimentos.
A Natureza respirava suave canção na brisa…
A palavra escorria dos lábios do jovem expositor
emocionado, como uma cascata de luz.
Havia algo estranho em tudo…
Subitamente, Ele apareceu ao lado do discípulo amado,
flutuando e incomparavelmente belo.
Todos foram dominados por estranho êxtase e o silêncio
esplêndido foi quebrado:
Venho ter convosco pela última vez.
Agora cumpre-me ascender ao meu Pai, que me espera.
Eu vos deixo como ovelhas mansas no meio de lobos
rapaces, quando beberão no mesmo regato em paz.
Nunca temais!
Pisareis em serpentes, aplacareis as dores dos enfermos,
limpareis a lepra dos corpos, os Espíritos maus vos respeitarão e sereis a
minha voz e mensagem ao mundo.
Não receeis a morte, porque sois imortais como Eu.
Demonstrai aos poderosos como são fracos e sem valor os
seus recursos e poderes de mentira no momento da morte.
Visitai as terras diferentes do mundo com a mesma
sinfonia do amor, apesar dos castigos que vos aplicarão.
Tende coragem e fé!
Eu vos aliviarei do pesado fardo e vos receberei em
júbilos após o testemunho.
Recordai sempre que Eu venci o mundo!
Sempre estarei convosco e nada mais nos separará.
Vencei a vida e a morte.
Ide e pregai sem cansaço.
Uma leve aragem acompanhava a Sua ascensão, enquanto o
poente fechava o leque de douradas plumas do Sol e Ele desapareceu.
Agora era ouvida a canção dos astros no firmamento.
Emocionados, todos deixaram a montanha e avançaram mundo
afora, falando e vivendo Jesus.
Em todos os séculos e lugares, depois dessa tarde
encantadora, eles têm renascido para manterem e divulgarem a Palavra.
Mártires, heróis, artistas, sábios, nobres e plebeus,
sempre perseguidos, têm reencarnado e o Evangelho tem salvado milhões de vidas
de todos quantos são fiéis a Jesus.
Na atualidade de sombras e horrores, eles estão nas
linhas de frente do trabalho, salvando vidas com solidariedade, em júbilo
peculiar porque Jesus está presente no mundo amparando e cuidando das Suas
ovelhas.
Cuida de seguir o teu rumo e não duvides nunca do milagre
do amor dAquele que nos deu a existência, a fim de que também, por nossa vez,
possamos fazer o mesmo.
Amélia Rodrigues / Divaldo Franco - Psicografia na sessão mediúnica da noite de 7.4.2021, no Centro Espírita Caminho da Redenção, em Salvador, Bahia