“Digo-vos, portanto, e peço-vos, em
nome do Senhor, que não torneis a proceder com a futilidade dos gentios, eles
que estão alheios à vida de Deus, por causa da ignorância em que se encontram e
do endurecimento de seus corações. Perdido todo senso de honestidade,
entregaram-se à desenfreada busca de prazeres, lançando-se com ardor a toda
sorte de impurezas.
Vós, porém, foi bem outra coisa que
aprendeste com Cristo, se é que de fato O tendes ouvido e n’Ele vos
instruístes. Aprendestes a trabalhar pela própria renovação, despojando-vos do
homem velho, que se corrompe ao sabor das paixões enganadoras, para serdes o homem
novo, criado à imagem de Deus, em justiça e retidão procedentes da Verdade”. (Efésios,
4: 17-24)
-o-
O homem comum, em todos os tempos, quando
procura as atividades religiosas, tem estado atento apenas aos aspectos
exteriores - presença física, ritos e rezas - acalentando a pretensão de que
esse tipo de participação, aliado à crença superficial nos poderes espirituais
que governam o Mundo, seja suficiente para garantir-lhe paz na terra e felicidade
no Céu.
Não obstante os esforços respeitáveis de
líderes religiosos mais lúcidos, que divulgam incansavelmente a necessidade de
uma vivência autêntica do Evangelho, as igrejas permanecem repletas dos
cristãos de hora certa - aqueles que aceitam o Cristo, que falam do Cristo, que
procuram o Cristo, apenas quando comparecem ao culto, movidos muito mais pelo
condicionamento social do que pelo propósito de buscar inspiração para um
comportamento mais nobre e puro, o que significaria estar com Jesus em todos os
momentos.
Essa presença nas igrejas, marcada pela
ausência do esforço íntimo de comunhão com o Cristo, tem mantido considerável
parcela das comunidades religiosas muito próximo da intemperança dos gentios,
que se empolgam exclusivamente por interesses e prazeres imediatistas.
Sendo a Doutrina Espírita a mensagem nova
que revive o Cristianismo com a linguagem da razão, alertando-nos quanto à
extensão de nossas responsabilidades diante da Vida, seria de esperar-se dos
espíritas um comportamento diferente. É preciso considerar, entretanto, que
fomos os cristãos distraídos de ontem e, lembrando André Luiz, contra a pálida
réstia de luz que há em nós hoje, representada pelo conhecimento da Terceira
Revelação, há montanhas de trevas acumuladas no passado inconsequente.
Por isso, revivem os Centros Espíritas os
mesmos dramas do Cristianismo de sempre, com a participação de velhos cristãos
de hora certa, que fazem das reuniões doutrinárias e mediúnicas um novo culto
exterior, marcado pela procura de favores da Espiritualidade, totalmente
desligados de qualquer propósito mais edificante.
Semelhantes males atingem até mesmo os que
participam ativamente das instituições espíritas, os quais, não obstante
dispostos ao trabalho, andam distraídos de suas responsabilidades, criando
variados problemas com um comportamento distanciado da ética espírita, que
prevê para o servidor o cumprimento das virtudes evangélicas como roteiro
indispensável, a fim de que valorize o serviço e desempenhe com proveito suas
tarefas.
E quando chamados à razão, convocados à
reformulação de suas atitudes, estes companheiros usam o velho e surrado
argumento: “Não esperem muito de mim!
Estou apenas tentando ser espírita! Ainda
sou fraco e pecador”!
Assim o colaborador da obra assistencial
explica a agressividade com que fere os beneficiários de seu trabalho e
complica o relacionamento com os companheiros...
Assim o expositor doutrinário justifica
vícios e mazelas que invalidam sua mensagem...
Assim o diretor de instituição espírita
desculpa seus deslizes morais e falhas de comportamento, que o situam no
lamentável farisaísmo religioso.
Talvez estes companheiros amem a Doutrina
Espírita, o Consolador prometido por Jesus, a luz bendita que explica a Vida e
lhe empresta objetivo e significado, mas, no fundo, amam muito mais a si
mesmos. Assim, comprometem-se e comprometem as tarefas a que foram chamados,
invertendo a recomendação evangélica: ao invés de renunciar a si mesmos para
seguir o Cristo, renunciam ao Cristo para seguir a si mesmos.
Somente superaremos semelhantes males na
medida em que nos conscientizarmos de que a jornada na Terra tem objetivos
inadiáveis, que poderiam ser resumidos numa única palavra: RENOVAÇÃO.
É para vencer milenárias tendências
inferiores, impulsos primitivos de animalidade que se manifestam na forma de
agressividade e violência, sensualidade e vício, inconsequência e desatino, que
estamos na carne, lutando e sofrendo, enfrentando, em regime de pagamento
compulsório, velhas dívidas; reencontrando velhos desafetos para ensaiar perdão;
revivendo velhas situações que marcaram nossas quedas no pretérito, a se apresentarem
como testes de nossas aquisições morais.
O roteiro de nossa vitória é exatamente
esse empenho de reformulação, a derrubada do homem velho, eivado de
imperfeições, para o nascimento do homem novo a que se refere Paulo, “criado à
imagem de Deus, em justiça e retidão procedentes da Verdade”.
Se não buscarmos essa renovação, pouco
produziremos, por melhores que sejam nossas intenções, porquanto faltará amor e
integridade em nós. A nossa vida será uma mentira, a nossa virtude recenderá a
mistificação, a nossa procura redundará em decepção, a nossa palavra soará sem eco,
sem que jamais consigamos edificar os corações e, o que é pior, sem que jamais
nos sintamos realizados e felizes.
Richard Simonetti – Livro: Em busca do Homem Novo