sexta-feira, 4 de fevereiro de 2022

O homem novo

 


“Digo-vos, portanto, e peço-vos, em nome do Senhor, que não torneis a proceder com a futilidade dos gentios, eles que estão alheios à vida de Deus, por causa da ignorância em que se encontram e do endurecimento de seus corações. Perdido todo senso de honestidade, entregaram-se à desenfreada busca de prazeres, lançando-se com ardor a toda sorte de impurezas.

Vós, porém, foi bem outra coisa que aprendeste com Cristo, se é que de fato O tendes ouvido e n’Ele vos instruístes. Aprendestes a trabalhar pela própria renovação, despojando-vos do homem velho, que se corrompe ao sabor das paixões enganadoras, para serdes o homem novo, criado à imagem de Deus, em justiça e retidão procedentes da Verdade”. (Efésios, 4: 17-24)

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O homem comum, em todos os tempos, quando procura as atividades religiosas, tem estado atento apenas aos aspectos exteriores - presença física, ritos e rezas - acalentando a pretensão de que esse tipo de participação, aliado à crença superficial nos poderes espirituais que governam o Mundo, seja suficiente para garantir-lhe paz na terra e felicidade no Céu.

Não obstante os esforços respeitáveis de líderes religiosos mais lúcidos, que divulgam incansavelmente a necessidade de uma vivência autêntica do Evangelho, as igrejas permanecem repletas dos cristãos de hora certa - aqueles que aceitam o Cristo, que falam do Cristo, que procuram o Cristo, apenas quando comparecem ao culto, movidos muito mais pelo condicionamento social do que pelo propósito de buscar inspiração para um comportamento mais nobre e puro, o que significaria estar com Jesus em todos os momentos.

Essa presença nas igrejas, marcada pela ausência do esforço íntimo de comunhão com o Cristo, tem mantido considerável parcela das comunidades religiosas muito próximo da intemperança dos gentios, que se empolgam exclusivamente por interesses e prazeres imediatistas.

Sendo a Doutrina Espírita a mensagem nova que revive o Cristianismo com a linguagem da razão, alertando-nos quanto à extensão de nossas responsabilidades diante da Vida, seria de esperar-se dos espíritas um comportamento diferente. É preciso considerar, entretanto, que fomos os cristãos distraídos de ontem e, lembrando André Luiz, contra a pálida réstia de luz que há em nós hoje, representada pelo conhecimento da Terceira Revelação, há montanhas de trevas acumuladas no passado inconsequente.

Por isso, revivem os Centros Espíritas os mesmos dramas do Cristianismo de sempre, com a participação de velhos cristãos de hora certa, que fazem das reuniões doutrinárias e mediúnicas um novo culto exterior, marcado pela procura de favores da Espiritualidade, totalmente desligados de qualquer propósito mais edificante.

Semelhantes males atingem até mesmo os que participam ativamente das instituições espíritas, os quais, não obstante dispostos ao trabalho, andam distraídos de suas responsabilidades, criando variados problemas com um comportamento distanciado da ética espírita, que prevê para o servidor o cumprimento das virtudes evangélicas como roteiro indispensável, a fim de que valorize o serviço e desempenhe com proveito suas tarefas.

E quando chamados à razão, convocados à reformulação de suas atitudes, estes companheiros usam o velho e surrado argumento: “Não esperem muito de mim!

Estou apenas tentando ser espírita! Ainda sou fraco e pecador”!

Assim o colaborador da obra assistencial explica a agressividade com que fere os beneficiários de seu trabalho e complica o relacionamento com os companheiros...

Assim o expositor doutrinário justifica vícios e mazelas que invalidam sua mensagem...

Assim o diretor de instituição espírita desculpa seus deslizes morais e falhas de comportamento, que o situam no lamentável farisaísmo religioso.

Talvez estes companheiros amem a Doutrina Espírita, o Consolador prometido por Jesus, a luz bendita que explica a Vida e lhe empresta objetivo e significado, mas, no fundo, amam muito mais a si mesmos. Assim, comprometem-se e comprometem as tarefas a que foram chamados, invertendo a recomendação evangélica: ao invés de renunciar a si mesmos para seguir o Cristo, renunciam ao Cristo para seguir a si mesmos.

Somente superaremos semelhantes males na medida em que nos conscientizarmos de que a jornada na Terra tem objetivos inadiáveis, que poderiam ser resumidos numa única palavra: RENOVAÇÃO.

É para vencer milenárias tendências inferiores, impulsos primitivos de animalidade que se manifestam na forma de agressividade e violência, sensualidade e vício, inconsequência e desatino, que estamos na carne, lutando e sofrendo, enfrentando, em regime de pagamento compulsório, velhas dívidas; reencontrando velhos desafetos para ensaiar perdão; revivendo velhas situações que marcaram nossas quedas no pretérito, a se apresentarem como testes de nossas aquisições morais.

O roteiro de nossa vitória é exatamente esse empenho de reformulação, a derrubada do homem velho, eivado de imperfeições, para o nascimento do homem novo a que se refere Paulo, “criado à imagem de Deus, em justiça e retidão procedentes da Verdade”.

Se não buscarmos essa renovação, pouco produziremos, por melhores que sejam nossas intenções, porquanto faltará amor e integridade em nós. A nossa vida será uma mentira, a nossa virtude recenderá a mistificação, a nossa procura redundará em decepção, a nossa palavra soará sem eco, sem que jamais consigamos edificar os corações e, o que é pior, sem que jamais nos sintamos realizados e felizes.

 

Richard Simonetti – Livro: Em busca do Homem Novo

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