Ségur, 9 de agosto de 1863. — (Médium: Sr. d’A…)
NOTA. —
Eu a ninguém dera ciência do assunto do livro em que estava trabalhando.
Conservara-lhe de tal modo em segredo o título, que o editor, Sr. Didier, só o
conheceu quando da impressão. Esse título foi, a princípio: Imitação do Evangelho. Mais tarde, por efeito de reiteradas observações do mesmo Sr.
Didier e de algumas outras pessoas, mudei-o para o de O Evangelho segundo o
Espiritismo. Assim, as reflexões contidas nas comunicações seguintes não
podem ser tidas como fruto de ideias preconcebidas do médium.
Pergunta. — Que pensais da nova obra em
que trabalho neste momento?
Resposta. — Esse livro de doutrina terá
considerável influência, pois que explanas questões capitais, e não só o mundo
religioso encontrará nele as máximas que lhe são necessárias, como também a
vida prática das nações haurirá dele instruções excelentes. Fizeste bem
enfrentando as questões de alta moral prática, do ponto de vista dos interesses
gerais, dos interesses sociais e dos interesses religiosos. A dúvida tem que
ser destruída; a terra e suas populações civilizadas estão prontas; já de há
muito os teus amigos de além-túmulo as arrotearam; lança, pois, a semente que
te confiamos, porque é tempo de que a Terra gravite na ordem irradiante das
esferas e que saia, afinal, da penumbra e dos nevoeiros intelectuais. Acaba a
tua obra e conta com a proteção do teu guia, guia de todos nós, e com o auxílio
devotado dos Espíritos que te são mais fiéis e em cujo número digna-te de me
incluir sempre.
P. — Que dirá o clero?
R. — O clero gritará — heresia,
porque verá que atacas decisivamente as penas eternas e outros pontos sobre os
quais ele baseia a sua influência e o seu crédito. Gritará tanto mais, quanto
se sentirá muito mais ferido do que com a publicação de O Livro dos
Espíritos, cujos dados principais, a rigor, poderia aceitar. Agora, porém,
tu entraste por um novo caminho, no qual não poderá ele acompanhar-te. O
anátema secreto se tornará oficial e os espíritas serão repelidos, como o foram
os judeus e os pagãos, pela Igreja Romana. Em compensação, os espíritas verão
aumentar-se-lhes o número, em virtude dessa espécie de perseguição, sobretudo
com o qualificarem, os padres, de demoníaca uma doutrina cuja moralidade
esplenderá como um raio de sol pela publicação mesma do teu novo livro e dos
que se seguirão.
Aproxima-se a
hora em que te será necessário apresentar o Espiritismo qual ele é, mostrando a
todos onde se encontra a verdadeira doutrina ensinada pelo Cristo. Aproxima-se
a hora em que, à face do céu e da Terra, terás de proclamar que o Espiritismo é
a única tradição verdadeiramente cristã e a única instituição verdadeiramente
divina e humana. Ao te escolherem, os Espíritos conheciam a solidez das tuas
convicções e sabiam que a tua fé, qual muro de aço, resistiria a todos os
ataques.
Entretanto,
amigo, se a tua coragem ainda não desfaleceu sob a tarefa tão pesada que
aceitaste, fica sabendo que foste feliz até ao presente, mas que é chegada a
hora das dificuldades. Sim, caro Mestre, prepara-se a grande batalha; o
fanatismo e a intolerância, exacerbados pelo bom êxito da tua propaganda, vão
atacar-te e aos teus com armas envenenadas. Prepara-te para a luta. Tenho,
porém, fé em ti, como tu tens fé em nós, e sei que a tua fé é das que
transportam montanhas e fazem caminhar por sobre as águas. Coragem, pois, e que
a tua obra se complete. Conta conosco e conta sobretudo com a grande alma do
Mestre de todos nós, que te protege de modo muito particular.
Obras póstumas — 2ª Parte / Capítulo 21.