quinta-feira, 8 de abril de 2021

Oração por humildade

 


Deus de Misericórdia!...

Auxilia-me a conservar o anseio de encontrar-te.

Quando haja tumulto, ao redor de mim, guarda-me o silêncio interior em que procure ouvir-te a voz.

Se algum êxito me busca, deixa-me perceber a tua bondade sobre a fraqueza que ainda sou.

Diante dos outros, consente, oh! Pai, que te assinale o infinito amor, valorizando-me a insignificância, através daqueles que me concedam afeto.

Se aparecerem adversários em meu caminho, faze-me vê-los como sendo instrumentos de trabalho, dentre aqueles com que me aperfeiçoas.

Na alegria, induze-me a descobrir-te a proteção paternal, estimulando-me a seguir para a frente.

Na dor, fortalece-me os ouvidos para que te escutem os chamamentos de paz.

E, quanto mais possa conhecer, em minha desvalia, os recursos iluminados do oceano de mundos e de seres que construístes no Universo, concede-me, oh! Deus de Misericórdia, que eu tenha a simplicidade da gota d'água que, embora unicamente anônima gota d'água, se sente tranquila e feliz porque se vê capaz de refletir-te a luz no brilho eterno da Criação.

Meimei / Chico Xavier – Livro: Amizade

sexta-feira, 2 de abril de 2021

A porta estreita

           

Em conhecida passagem do Evangelho, Jesus exorta os homens a que entrem pela porta estreita, alertando-os de que larga é a porta, e espaçoso, o caminho que conduz à perdição, e muitos são os que entram por ela; E porque estreita é a porta, e apertado, o caminho que leva à vida, e poucos há que a encontrem (Mateus, 7:13-14).

É preciso compatibilizar tais assertivas com a figura de um Deus pleno de amor, justiça, bondade e poder que Ele apresentou à humanidade como um autêntico Pai.

Afinal, tem-se um Pai amoroso estabelecendo nos roteiros de Seus filhos uma passagem estreita e de difícil acesso à felicidade, enquanto a porta para a perdição apresenta-se larga, a ponto de serem poucos os que se saem bem na escolha.

O Espírito Emmanuel, mentor do médium Francisco Cândido Xavier, ajuda a entender a metáfora. No livro Ceifa de luz, ele assevera que nosso dever é nossa escola e que a senda estreita a que se refere Jesus é a fidelidade que nos cabe manter limpa e constante, no culto às obrigações assumidas diante do Bem Eterno. Ainda afirma que, para sustentá-la, é imprescindível sacrificar no santuário do coração tudo aquilo que constitua bagagem de sombra no campo de nossas aspirações e desejos.

Dessas reflexões, surge claro que a passagem pela porta estreita implica o cumprimento dos próprios deveres, o que o homem apenas consegue mediante o sacrifício de seus vícios e paixões negativas.

Os deveres que a vida impõe representam um programa de aprendizado e sublimação, traçado antes da reencarnação, o qual o Espírito se propôs a cumprir. O atendimento de tais deveres costuma ser árduo, pois a eles se contrapõem os hábitos do homem velho, necessitado de retificar suas concepções e se adequar à harmonia das leis cósmicas.

Conforme Kardec elucida em O livro dos Espíritos, nas questões 614 e seguintes, Deus rege o universo com base em leis perfeitas, plenas de justiça e misericórdia, voltadas a realizar a felicidade do homem. Elas lhe indicam o que deve fazer ou deixar de fazer e ele só é infeliz quando delas se afasta. Ou seja, a felicidade deve constituir a regra, e não a exceção.

Em O Evangelho Segundo o Espiritismo, no capítulo XVIII, item 5, esclarece-se que a porta da salvação não é estreita para a Humanidade em geral, mas apenas para uma sua parcela situada, pelo seu próprio estado evolutivo, em um mundo de provas e expiações. Afinal, não faz mesmo sentido que um Deus amoroso estabeleça uma sistemática na qual a conquista da felicidade é extremamente difícil, a ponto de ensejar a perdição da maioria de Suas criaturas.

A estreiteza da porta traduz, por assim dizer, uma pequena crise do processo evolutivo, na qual o ser imortal é convidado à transcendência, ao abandono de hábitos e sentimentos próprios de fases mais primitivas, mas se apega a eles com certa insistência.

Segundo se infere da Codificação, os mundos de provas e expiações se caracterizam pela imensa maioria de seus habitantes ser formada de Espíritos com importantes conquistas intelectuais, mas moralidade vacilante, pífia, revelada pela presença de numerosos vícios e paixões negativas.

Extrai-se de O Livro dos Espíritos que as paixões humanas não são negativas em seu princípio, na medida em que este se encontra na natureza e tudo o que Deus faz é bom e tem utilidade providencial (questão 907).

As paixões podem levar à realização de grandes coisas, pois decuplicam as forças do homem e o auxiliam na execução dos desígnios da Providência (LE, questão 908). Elas apenas se tornam negativas quando o homem não mais as governa, mas é por elas governado, e causam prejuízo para ele ou para outrem.

A Espiritualidade Superior é enfática ao afirmar que o homem, pelos seus esforços, pode vencer as suas más inclinações. Ela aduz que falta ao homem é vontade de se reformar e ainda lamenta: Ah, quão poucos dentre vós fazem esforços! (LE, questão 909).

Bem se vê que a Humanidade terrena passa por uma crise evolutiva, mais propriamente por uma crise de moralidade, revelada pela vivência de paixões negativas, sobre as quais não exerce o devido controle, quando poderia fazê-lo.

A disciplina em controlar as próprias tendências negativas exige algum esforço, mas é plenamente viável. Ela constitui o necessário para viabilizar a passagem pela porta estreita de que fala o Evangelho. Trata-se de domar em si a ira, o orgulho, a inveja, o egoísmo, o ciúme, a gula, o desequilíbrio da sexualidade, dentre outros hábitos e sentimentos infelizes.

Deus, em Sua sabedoria e em Sua bondade, situa o Espírito encarnado em ambientes nos quais ele é naturalmente convidado à sublimação. Coloca-o em um contexto profissional, familiar e social em que precisa atender uma série de deveres. Se os atende, sacrificando para isso suas fantasias, caprichos e desejos, atravessa a sua porta estreita, a que lhe cabe naquela encarnação.

É necessário e urgente que a criatura encarnada se empenhe em ser um profissional honesto e competente, um pai ou mãe presente e dedicado, um filho respeitoso e obediente, um aluno estudioso, um irmão compreensivo, um esposo fiel e afetuoso, um cidadão honesto, etc.  Ela precisa atentar para os deveres de cada dia e cumpri-los, sem buscar desculpas para a conduta indigna.

Como ensina o Espírito Lázaro, no item 7 do capítulo XVII de O Evangelho Segundo o Espiritismo, na ordem dos sentimentos, o dever é muito difícil de cumprir-se, por se achar em antagonismo com as atrações do interesse e do coração. Ele também afirma que o dever é o mais belo laurel da razão.

Então, o senso do dever é o mais belo, o maior prêmio que a razão esclarecida confere ao homem. Ele lhe possibilita identificar o que deve fazer, embora a conduta identificada, por vezes, contrarie os desejos mais profundos de seu coração. Uma vez feita essa identificação, resta aplicar a vontade firme para viver e fazer o que é certo, o que implica domar os maus instintos, essa velha herança do primitivismo que impede a conquista da paz e da plenitude. Trata-se da evolução intelectual auxiliando a consolidação da evolução moral.

Convém ressaltar que a evolução moral constitui a conquista por excelência, que faz o Espírito ascender na escala espiritual. A Espiritualidade Superior admite três grandes ordens ou categorias principais de classificação na referida escala, a saber: Espíritos imperfeitos, bons Espíritos e Espíritos puros (LE, questões 100 e ss.).

Para passar de Espírito imperfeito para bom Espírito, o ser imortal precisa vencer por completo as más paixões e ter apenas o desejo do bem. Não são a intelectualidade, os conhecimentos e a ciência que fazem a diferença, mas a questão moral. Conforme consta da questão 107 de O Livro dos Espíritos, os bons Espíritos retiram do amor que os une uma fonte de inefável ventura, que não tem a perturbá-la nem a inveja, nem os remorsos, nem nenhuma das más paixões que constituem o tormento dos Espíritos imperfeitos.

Essa peculiaridade de desejar apenas o bem, de não possuir mais paixões malévolas, é que torna os bons Espíritos tão notáveis, às vezes até incompreensíveis, em sua psicologia.

Um bom exemplo a ser citado é o do Espírito Joanna de Ângelis, mentora do médium Divaldo Pereira Franco, na encarnação em que ostentou o nome de Joana de Cusa e conviveu com Jesus. Segundo a narrativa do livro Boa Nova, do Espírito Humberto de Campos, ditado ao médium Francisco Cândido Xavier, ao final da vida ela se encontrava, juntamente com um filho, amarrada ao poste do martírio. Por ser cristã e não renegar sua fé, foi condenada a ser queimada viva.

Nos derradeiros instantes de sua vida, quando as labaredas já lhe lambiam o corpo envelhecido, a soldadesca ainda a importunava. Um dos soldados lhe indagou se o Cristo apenas lhe havia ensinado a morrer. Ela buscou tomar fôlego, por entre as dores do martírio, e encontrou forças para responder: Não apenas a morrer, mas também a vos amar!

Impressiona que uma pessoa, em instante tão crítico, sendo queimada viva e ainda provocada, tenha encontrado forças para proclamar seu amor pelo verdugo. A chave para entender essa conduta é considerar que Joana de Cusa, nesse momento, já era um bom Espírito. Ela já havia vencido o mal em si mesma, domado todas as paixões negativas. Ela não poderia blasfemar ou ofender, pois nada disso mais existia nela. Em seu íntimo pacificado, havia apenas o bem. Ela já havia cruzado a porta estreita.

Ocorre que ninguém consegue o pleno domínio das más paixões em um repente e nem surge sublime de um instante para o outro. A evolução é um processo gradativo, embora possa ser acelerado enormemente pela vontade.

Pode-se afirmar que há a porta estreita situada ao término de uma longa jornada, que marca a transição da fase de Espírito imperfeito para a de bom Espírito. Mas também existe a porta estreita de cada existência, a fim de que ela seja bem aproveitada.

Deus é que dosa as experiências, conforme as possibilidades de cada um de Seus filhos.

Ao homem resta, em sua condição de aprendiz na grande escola da vida, identificar e cumprir os seus deveres de cada dia. Entender que a sua felicidade não vem de realizar fantasias e caprichos, que frequentemente apenas refletem o desejo de reviver hábitos de um passado que convém deixar para trás em caráter definitivo.

Finalmente, compreender que lhe compete basicamente ser digno e bondoso e aplicar a vontade firme na realização desse projeto, que constitui o seu roteiro de libertação, a sua porta estreita.

 

Dineu de Paula - Jornal Mundo Espírita – Fonte: www.mundoespirita.com.br

Prece da mocidade espírita

 


Senhor!

Ensina-me a servir ao próximo para que eu aprenda a servir-Te.

Não me abandones à vontade das experiências inferiores, nem me confies aos meus próprios desejos.

Venho hoje ao encontro do Teu Evangelho de Luz, mas trago no coração a sombra em que respirei até ontem.

Mestre, querer é poder, todavia, induz-me a querer o Bem para que o mal não me inutilize.

Fazei-me sentir que somente os meios retos conduzem aos fins corretos.

Dá-me a cultura da inteligência e do coração.

Não me deixe vaguear na razão da força para que a força da razão me auxilie a discernir.

Guia-me os propósitos para que a minha coragem não seja petulância e para que a minha humildade não seja abjeção.

Fortalece-me o pensamento no estudo e guarda minhas mãos no trabalho digno.

Mostra-me o amor que brilha no espírito, acima do nevoeiro da carne, a fim de que não me precipite na voragem da ilusão.

Inspira-me o respeito aos companheiros mais velhos que me dirigem os passos, para que a irreverência não me conduza ao escárnio de meu próprio caminho.

Inspira-me a compreensão, a diligência e a fraternidade!

Ampara-me na conquista do prêmio do dever bem cumprido.

Sustenta-me para que eu seja fiel ao Bem e ensina-me que, à claridade da Tua Bênção, depende apenas de mim que eu seja pior ou melhor, hoje e amanhã!

Auxilia, perdoa, trabalha, ama e serve, gastando sensatamente os recursos que o Céu te situou no caminho e nas mãos, como quem sabe que a Contabilidade Divina a todos nos procura no grave instante do acerto justo.

 

Bezerra de Menezes / Chico Xavier – Livro: Mentores e Seareiros

A verdade


“Eu sou o caminho e a verdade.” — Jesus (João, 14.6)

Por enquanto, ninguém se atreverá, em boa lógica, a exibir, na Terra, a verdade pura, ante a visão das forças coletivas.

A profunda diversidade das mentes, com a heterogeneidade de caracteres e temperamentos, aspirações e propósitos, impede a exposição da realidade plena ao espírito das massas comuns.

Cada escola religiosa, em razão disso, mantém no mundo cursos diferentes da revelação gradativa. A claridade imaculada não seria, no presente estágio da evolução humana, assimilável por todos, de imediato.

Há que esperar pela passagem das horas. Nos círculos do tempo, a semente, com o esforço do homem, provê o celeiro; e o carvão, com o auxílio da natureza, se converte em diamante.

Por isto, vemos verdades estagnadas nas igrejas dogmáticas, verdades provisórias nas ciências, verdades progressivas nas filosofias, verdades convenientes nas lides políticas e verdades discutíveis em todos os ângulos da vida civilizada.

Semelhante imperativo, porém, para a mentalidade cristã, apenas vigora quanto às massas.

Diante de cada discípulo, no reino individual, Jesus é a verdade sublime e reveladora.

Todo aquele que lhe descobre a luz bendita, absorve-lhe os raios celestes, transformadores… E começa a observar a experiência sob outros prismas, elege mais altos padrões de luta, descortina metas santificantes e identifica-se com horizontes mais largos. O reino do próprio coração passa a gravitar ao redor do novo centro vital, glorioso e eterno. E à medida que se vai desvencilhando das atrações da mentira, cada discípulo do Senhor penetra mais intensivamente na órbita da Verdade, que é a Pura Luz.

Emmanuel / Chico Xavier – Vinha de Luz – FEB – cap. 175 

Aniversário de Chico Xavier

 


sábado, 27 de março de 2021

Biografia do Sr. Allan Kardec

 


É ainda sob o golpe da dor profunda que nos causou a prematura partida do venerável fundador da Doutrina Espírita, que nos abalançamos a uma tarefa, simples e fácil para suas mãos sábias e experientes, mas cujo peso e gravidade nos esmagariam, se não contássemos com o auxílio eficaz dos Espíritos bons e com a indulgência dos nossos leitores.

Quem, dentre nós, poderia, sem ser tachado de presunçoso, lisonjear-se de possuir o espírito de método e organização de que se mostram iluminados todos os trabalhos do mestre? Só a sua pujante inteligência podia concentrar tantos materiais diversos, triturá-los e transformá-los, para os espalhar em seguida, como orvalho benfazejo, sobre as almas desejosas de conhecer e de amar.

Incisivo, conciso, profundo, sabia agradar e fazer compreendido numa linguagem simples e elevada, ao mesmo tempo, tão distanciada do estilo familiar quanto das obscuridades da metafísica.

Multiplicando-se incessantemente, pudera até agora bastar a tudo. Entretanto, o cotidiano alargamento de suas relações e o contínuo desenvolvimento do Espiritismo lhe faziam sentir a necessidade de reunir em torno de si alguns auxiliares inteligentes e preparava simultaneamente a nova organização da Doutrina e de seus labores, quando nos deixou, para ir, num mundo melhor, receber a sanção da missão que desempenhara e coletar elementos para uma nova obra de devotamento e sacrifício.

Era sozinho!... Chamar-nos-emos legião e, por muito fracos e inexperientes que sejamos, nutrimos a convicção íntima de que nos conservaremos à altura da situação, se, partindo dos princípios estabelecidos e de incontestável evidência, nos consagrarmos a executar, tanto quanto nos seja possível e de acordo com as necessidades do momento, os projetos que ele pretendia realizar no futuro.

Enquanto nos mantivermos nas suas pegadas e todos os de boa vontade se unirem, num esforço comum pelo progresso e pela regeneração intelectual e moral da Humanidade, conosco estará o Espírito do grande filósofo a nos secundar com a sua influência poderosa, dado lhe seja possível suprir à nossa insuficiência e nos possamos mostrar dignos do seu concurso, dedicando-nos à obra com a mesma abnegação e a mesma sinceridade que ele, embora sem tanta ciência e inteligência.

Em sua bandeira, inscrevera o mestre estas palavras:

Trabalho, solidariedade, tolerância. Sejamos, como ele, infatigáveis; sejamos acordemente com os seus anseios, tolerantes e solidários e não temamos seguir-lhe o exemplo, reconsiderando, quantas vezes forem precisas, os princípios ainda controvertidos. Apelemos ao concurso e às luzes de todos. Tentemos avançar, antes com segurança e certeza, do que com rapidez, e não ficarão infrutíferos os nossos esforços se, como estamos persuadidos, e seremos os primeiros a dar disso exemplo, cada um cuidar de cumprir o seu dever, pondo de lado todas as questões pessoais, a fim de contribuir para o bem geral.

Sob auspícios mais favoráveis não poderíamos entrar na nova fase que se abre para o Espiritismo, do que dando a conhecer aos nossos leitores, num rápido escorço, o que foi, durante toda a sua vida, o homem íntegro e honrado, o sábio inteligente e fecundo, cuja memória se transmitirá aos séculos vindouros com a auréola dos benfeitores da Humanidade.

Nascido em Lyon, a 3 de outubro de 1804, de uma família antiga que se distinguiu na magistratura e na advocacia, Allan Kardec (Hippolyte Léon Denizard Rivail) não seguiu essas carreiras. Desde a primeira juventude, sentiu-se inclinado ao estudo das ciências e da filosofia.

Educado na Escola de Pestalozzi, em Yverdun (Suíça), tornou-se um dos mais eminentes discípulos desse célebre professor e um dos zelosos propagandistas do seu sistema de educação, que tão grande influência exerceu sobre a reforma do ensino na França e na Alemanha.

Dotado de notável inteligência e atraído para o ensino, pelo seu caráter e pelas suas aptidões especiais, já aos quatorze anos ensinava o que sabia àqueles dos seus condiscípulos que haviam aprendido menos do que ele. Foi nessa escola que lhe desabrocharam as ideias que mais tarde o colocariam na classe dos homens progressistas e livres-pensadores.

Nascido sob a religião católica, mas educado num país protestante, os atos de intolerância que por isso teve de suportar, no tocante a essa circunstância, cedo o levaram a conceber a ideia de uma reforma religiosa, na qual trabalhou em silêncio durante longos anos com o intuito de alcançar a unificação das crenças.

Faltava-lhe, porém, o elemento indispensável à solução desse grande problema.

O Espiritismo veio, a seu tempo, imprimir-lhe especial direção aos trabalhos.

Concluídos seus estudos, voltou para a França.

Conhecendo a fundo a língua alemã, traduziu para a Alemanha diferentes obras de educação e de moral e, o que é muito característico, as obras de Fénelon, que o tinham seduzido de modo particular. (...)

 “Pelo ano de 1855, posta em foco a questão das manifestações dos Espíritos, Allan Kardec se entregou a observações perseverantes sobre esse fenômeno, cogitando principalmente de lhe deduzir as consequências filosóficas.

Entreviu, desde logo, o princípio de novas leis naturais: as que regem as relações entre o mundo visível e o mundo invisível.

Reconheceu, na ação deste último, uma das forças da Natureza, cujo conhecimento haveria de lançar luz sobre uma imensidade de problemas tidos por insolúveis, e lhe compreendeu o alcance, do ponto de vista religioso.

“Suas obras principais sobre esta matéria são: O Livro dos Espíritos, referente à parte filosófica, e cuja primeira edição apareceu a 18 de abril de 1857; O Livro dos Médiuns, relativo à parte experimental e científica (janeiro de 1861); O Evangelho segundo o Espiritismo, concernente à parte moral (abril de 1864); O Céu e o Inferno, ou a Justiça de Deus segundo o Espiritismo (agosto de 1865); A Gênese, os milagres e as predições (janeiro de 1868); a Revista Espírita, jornal de estudos psicológicos, periódico mensal começado a 1o de janeiro de 1858. Fundou em Paris, a 1o de abril de 1858, a primeira Sociedade espírita regularmente constituída, sob a denominação de Sociedade Parisiense de Estudos Espíritas, cujo fim exclusivo era o estudo de quanto possa contribuir para o progresso da nova ciência. Allan Kardec se defendeu, com inteiro fundamento, de coisa alguma haver escrito debaixo da influência de ideias preconcebidas ou sistemáticas. Homem de caráter frio e calmo, observou os fatos e de suas observações deduziu as leis que os regem. Foi o primeiro a apresentar a teoria relativa a tais fatos e a formar com eles um corpo de doutrina, metódico e regular.

“Demonstrando que os fatos erroneamente qualificados de sobrenaturais se acham submetidos a leis, ele os incluiu na ordem dos fenômenos da Natureza, destruindo assim o último refúgio do maravilhoso e um dos elementos da superstição.

“Durante os primeiros anos em que se tratou de fenômenos espíritas, estes constituíram antes objeto de curiosidade, do que de meditações sérias. O Livro dos Espíritos fez que o assunto fosse considerado sob aspecto muito diverso.

Abandonaram-se as mesas girantes, que tinham sido apenas um prelúdio, e começou-se a atentar na doutrina, que abrange todas as questões de interesse para a Humanidade.

“Data do aparecimento de O Livro dos Espíritos a fundação do Espiritismo que, até então, só contara com elementos esparsos, sem coordenação, e cujo alcance nem toda gente pudera apreender. A partir daquele momento, a doutrina prendeu a atenção dos homens sérios e tomou rápido desenvolvimento. Em poucos anos, aquelas ideias conquistaram numerosos aderentes em todas as camadas sociais e em todos os países. Esse êxito sem precedentes decorreu sem dúvida da simpatia que tais ideias despertaram, mas também é devido, em grande parte, à clareza com que foram expostas e que é um dos característicos dos escritos de Allan Kardec.

“Evitando as fórmulas abstratas da Metafísica, ele soube fazer que todos o lessem sem fadiga, condição essencial à vulgarização de uma ideia. Sobre todos os pontos controversos, sua argumentação, de cerrada lógica, poucas ensanchas oferece à refutação e predispõe à convicção. As provas materiais que o Espiritismo apresenta da existência da alma e da vida futura tendem a destruir as ideias materialistas e panteístas. Um dos princípios mais fecundos dessa doutrina e que deriva do precedente é o da pluralidade das existências(...)

Conservara-se, todavia, em estado de hipótese e de sistema, enquanto o Espiritismo lhe demonstra a realidade e prova que nesse princípio reside um dos atributos essenciais da Humanidade. Dele promana a explicação de todas as aparentes anomalias da vida humana, de todas as desigualdades intelectuais, morais e sociais, facultando ao homem saber donde vem, para onde vai, para que fim se acha na Terra e por que aí sofre.

“As ideias inatas se explicam pelos conhecimentos adquiridos nas vidas anteriores; a marcha dos povos e a da Humanidade, pela ação dos homens dos tempos idos e que revivem, depois de terem progredido; as simpatias e antipatias, pela natureza das relações anteriores. Essas relações, que religam a grande família humana de todas as épocas, dão por base, aos grandes princípios de fraternidade, de igualdade, de liberdade e de solidariedade universal, as próprias leis da Natureza e não mais uma simples teoria.

 “Em vez do postulado: Fora da Igreja não há salvação, que alimenta a separação e a animosidade entre as diferentes seitas religiosas e que há feito correr tanto sangue, o Espiritismo tem como divisa: Fora da Caridade não há salvação, isto é, a igualdade entre os homens perante Deus, a tolerância, a liberdade de consciência e a benevolência mútua.

“Em vez da fé cega, que anula a liberdade de pensar, ele diz: Fé inabalável só o é a que pode encarar face a face a razão, em todas as épocas da Humanidade. À fé, uma base se faz necessária e essa base é a inteligência perfeita daquilo em que se tem de crer. Para crer, não basta ver, é preciso, sobretudo, compreender. A fé cega já não é para este século.

É precisamente ao dogma da fé cega que se deve o ser hoje tão grande o número de incrédulos, porque ela quer impor-se e exige a abolição de uma das mais preciosas faculdades do homem: o raciocínio e o livre-arbítrio.”  (O Evangelho segundo o Espiritismo.)

Trabalhador infatigável, sempre o primeiro a tomar da obra e o último a deixá-la, Allan Kardec sucumbiu, a 31 de março de 1869, quando se preparava para uma mudança de local, imposta pela extensão considerável de suas múltiplas ocupações. Diversas obras que ele estava quase a terminar, ou que aguardavam oportunidade para vir a lume, demonstrarão um dia, ainda mais, a extensão e o poder das suas concepções.

Morreu conforme viveu: trabalhando. Sofria, desde longos anos, de uma enfermidade do coração, que só podia ser combatida por meio do repouso intelectual e pequena atividade material. Consagrado, porém, todo inteiro à sua obra, recusava-se a tudo o que pudesse absorver um só que fosse de seus instantes, à custa das suas ocupações prediletas. Deu-se com ele o que se dá com todas as almas de forte têmpera: a lâmina gastou a bainha.

O corpo se lhe entorpecia e se recusava aos serviços que o Espírito lhe reclamava, enquanto este último, cada vez mais vivo, mais enérgico, mais fecundo, ia sempre alargando o círculo de sua atividade.

Nessa luta desigual não podia a matéria resistir eternamente. Acabou sendo vencida: rompeu-se o aneurisma e Allan Kardec caiu fulminado. Um homem houve de menos na Terra; mas, um grande nome tomava lugar entre os que ilustraram este século; um grande Espírito fora retemperar-se no Infinito, onde de todos os que ele consolara e esclarecera lhe aguardavam impacientes a volta!

“A morte, dizia, faz pouco tempo, redobra os seus golpes nas fileiras ilustres!... A quem virá ela agora libertar?”

Ele foi, como tantos outros, recobrar-se no Espaço, procurar elementos novos para restaurar o seu organismo gasto por uma vida de incessantes labores. Partiu com os que serão os fanais da nova geração, para voltar em breve com eles a continuar e acabar a obra deixada em dedicadas mãos.

O homem já aqui não está; a alma, porém, permanecerá entre nós. Será um protetor seguro, uma luz a mais, um trabalhador incansável que as falanges do Espaço conquistaram. Como na Terra, sem ferir a quem quer que seja, ele fará que cada um lhe ouça os conselhos oportunos; abrandará o zelo prematuro dos ardorosos, amparará os sinceros e os desinteressados e estimulará os tíbios. Vê agora e sabe tudo o que ainda há pouco previa! Já não está sujeito às incertezas, nem aos desfalecimentos e nos fará partilhar da sua convicção, fazendo-nos tocar com o dedo a meta, apontando-nos o caminho, naquela linguagem clara, precisa, que o tornou aureolado nos anais literários.

Já não existe o homem, repetimo-lo. Entretanto, Allan Kardec é imortal e a sua memória, seus trabalhos, seu Espírito estarão sempre com os que empunharem forte e vigorosamente o estandarte que ele soube sempre fazer respeitado.

Uma individualidade pujante constituiu a obra. Era o guia e o farol de todos. Na Terra, a obra substituirá o obreiro. Os crentes não se congregarão em torno de Allan Kardec; congregar-se-ão em torno do Espiritismo, tal como ele o estruturou e, com os seus conselhos, sua influência, avançaremos, a passos firmes, para as fases ditosas prometidas à Humanidade regenerada.

Revista Espírita – maio/1869

Plataforma do Mestre

 

“Ele salvará seu povo dos pecados deles.” (Mateus, 1:21)


Em verdade, há dois mil anos, o povo acreditava que Jesus seria um comandante revolucionário, como tantos outros, a desvelar-se por reivindicações políticas, à custa da morte, do suor e das lágrimas de muita gente.

Ainda hoje, vemos grupos compactos de homens indisciplinados que, administrando ou obedecendo, se reportam ao Cristo, interpretando-o qual se fora patrono de rebeliões individuais, sedento de guerra civil.

Entretanto, do Evangelho não transparece qualquer programa nesse sentido.

Que Jesus é o Divino Governador do Planeta não podemos duvidar.

O que fará Ele do mundo redimido ainda não sabemos, porque ao soldado humílimo são defesos os planos do General.

A Boa Nova, todavia, é muito clara, quanto à primeira plataforma do Mestre dos mestres. Ele não apresentava títulos de reformador dos hábitos políticos, viciados pelas más inclinações de governadores e governados de todos os tempos.

Anunciou-nos a celeste revelação que Ele viria salvar-nos de nossos próprios pecados, libertar-nos da cadeia de nossos próprios erros, afastando-nos do egoísmo e do orgulho que ainda legislam para o nosso mundo consciencial.

Achamo-nos, até hoje, em simples fase de começo de apostolado evangélico Cristo libertando o homem das chagas de si mesmo, para que o homem limpo consiga purificar o mundo.

O reino individual que puder aceitar o serviço liberatório do Salvador encontrará a vida nova.

Emmanuel / Chico Xavier – Vinha de Luz – FEB – cap. 174

sábado, 20 de março de 2021

Conselhos de família

 


(Primeira sessão)

Foi perguntado ao Espírito protetor da família se ele podia dar alguns conselhos aos membros presentes; ele respondeu:

Sim. Tenham confiança em Deus e procurem instruir-se nas verdades imutáveis e eternas que lhes ensina o livro divino da Natureza.

Ele contém toda a lei de Deus, e os que sabem ler e o compreendem são os únicos a seguirem o verdadeiro caminho da sabedoria.

Que nada do que vejam seja negligenciado, porquanto cada coisa traz em si um ensinamento e deve, pelo uso do raciocínio, elevar a alma para Deus e dele aproximá-la.

Em tudo quanto ferir a inteligência, procurem sempre distinguir o bem do mal: o primeiro, para o praticar; o segundo, para o evitar.

Antes de formular um julgamento, voltem sempre o pensamento para o ETERNO, que os guiará ao bem, E NÃO OS ENGANARÁ JAMAIS.

 

(Segunda sessão) 

Boa-noite, meus filhos. Se me amais, procurai instruir-vos; reuni-vos muitas vezes com este pensamento.

Ponde vossas ideias em comum: é um excelente meio, pois em geral não comunicamos senão as coisas que julgamos boas; temos vergonha das más.

Assim, são guardadas em segredo ou só são comunicadas aos que queremos tornar cúmplices. Distinguem-se os bons dos maus pensamentos, porque os primeiros podem, sem nenhum receio, ser transmitidos a todo o mundo, ao passo que os últimos não poderiam, sem perigo, ser comunicados senão a alguns.

Quando vos vier um pensamento, para julgar de seu valor perguntai-vos se podeis torná-lo público sem inconveniente e se não fará mal: se vossa consciência vo-lo autorizar, não temais, vosso pensamento é bom.

Dai-vos mutuamente bons conselhos, tendo em vista somente o bem daquele a quem os dais, e não o vosso.

Vossa recompensa estará no prazer que experimentareis por terdes sido úteis. A união dos corações é a mais fecunda fonte de felicidades; e, se muitos homens são infelizes, é que só procuram a felicidade para si mesmos.

Ela lhes escapa precisamente porque julgam encontrá-la somente no egoísmo. Digo a felicidade e não a fortuna, porquanto esta última só tem servido como sustentáculo à injustiça, e o objetivo da existência é a justiça.

Se a justiça fosse praticada entre os homens, o mais afortunado seria aquele que realizasse maior soma de boas obras.

Se, pois, quiserdes tornar-vos ricos, meus filhos, praticai muitas ações boas.

Pouco importam os bens do mundo; não é a satisfação da carne que se deve buscar, mas a da alma.

Aquela é efêmera; esta é eterna.

Por hoje é bastante.

Meditai estes conselhos e esforçai-vos para pô-los em prática: aí se encontra o caminho da salvação.

 

Conselhos ditados numa reunião íntima, por um Espírito eminentemente superior e benevolente

Revista Espírita – janeiro/1860


O pão divino

 

“Moisés não vos deu o pão do Céu; mas meu Pai vos dá o verdadeiro pão do Céu.”

Jesus (João, 6:32)

Toda arregimentação religiosa na Terra não tem escopo maior que o de preparar as almas, ante a grandeza da vida espiritual.

Templos de pedra arruínam-se.

Princípios dogmáticos desaparecem.

Cultos externos modificam-se.

Revelações ampliam-se.

Sacerdotes passam.

Todos os serviços da fé viva representam, de algum modo, aquele pão que Moisés dispensou aos hebreus, alimento valioso sem dúvida, mas que sustentava o corpo apenas por um dia, e cuja finalidade primordial é a de manter a sublime oportunidade da alma em busca do verdadeiro pão do Céu.

O Espiritismo Evangélico, nos dias que correm, é abençoado celeiro desse pão. Em suas linhas de trabalho, há mais certeza e esperança, mais entendimento e alegria.

Esteja, porém, cada companheiro convencido de que o esforço pessoal no pão divino para a renovação, purificação e engrandecimento da alma há de ser culto dominante no aprendiz ou prosseguiremos nas mesmas obscuridades mentais e emocionais de ontem.

Observações de ordem fenomênica destinam-se ao olvido.

Afirmativas doutrinárias elevam-se para o bem.

Horizontes do conhecimento dilatam-se ao infinito.

Processos de comunicação com o invisível progridem sempre. Médiuns sucedem-se uns aos outros.

Se procuras, pois, a própria felicidade, aplica-te com todas as energias ao aproveitamento do pão divino que desce do Céu para o teu coração, através da palavra dos benfeitores espirituais, e aprende a subir, com a mente inflamada de amor e luz, aos inesgotáveis celeiros do pão celestial.

 

Emmanuel / Chico Xavier – Vinha de Luz – FEB – cap. 173