(...) As
primeiras experiências espiritistas, na pátria do Evangelho, começaram no
problema das curas. Em 1818, já o Brasil possuía um grande círculo homeopático,
sob a direção do mundo invisível. O próprio José Bonifácio correspondia-se com
Frederico Hahnemann. Nos tempos do Segundo Reinado, os mentores invisíveis
conseguem localizar na Bahia, no Pará e no Rio de Janeiro, alguns grupos
particulares, que projetavam enormes claridades no movimento neoespiritualista
do continente, talvez o primeiro da América do Sul.
Antes dessa
época, quando prestes a findar o Primeiro Reinado, Ismael reúne no Espaço os
seus dedicados companheiros de luta e, organizada a venerável assembleia, o
grande mensageiro do Senhor esclarece a todos, sobre os seus elevados
objetivos.
— “Irmãos,
explicou ele, o século atual, como sabeis, vai assinalar a vinda do Consolador
à face da Terra. Nestes cem anos, se efetuarão os grandes movimentos
preparatórios dos outros cem anos que hão de vir. As rajadas de morticínio e de
dor prenderão a alma da Humanidade, no século próximo, dentro dos imperativos
das transições necessárias, que constituem o sinal do fim da civilização
precária do Ocidente… Faz-se mister ampararmos o coração atormentado dos homens
nessas grandes amarguras, preparando-lhes o caminho da purificação espiritual,
através das sendas penosas. É preciso, pois, prepararmos o terreno para a sua
estabilidade moral nesses instantes decisivos dos seus destinos. Numerosas
fileiras de missionários encontram-se disseminadas, entre as nações da Terra,
com o fim de levantar a palavra da Boa Nova do Senhor, esclarecendo os
postulados científicos que surgirão neste século, nos círculos da cultura
terrestre. Uma verdadeira renascença das filosofias e das ciências se
verificará no transcurso destes anos, a fim de que o século XX seja
necessariamente esclarecido, como elemento de ligação entre a civilização em
vias de desaparecer e a civilização do futuro, que se constituirá da
fraternidade e da justiça, porque a morte do mundo, prevista na Lei e nos
profetas, não se verificará por enquanto, com referência às expressões físicas
do globo, mas quanto às suas expressões morais, sociais e políticas. A
civilização armada terá de perecer, para que os homens se amem como irmãos. Concentraremos,
agora, os nossos esforços na terra do Evangelho, para que possamos plantar no
coração de seus filhos as sementes benditas que, mais tarde, frutificarão no solo
abençoado do Cruzeiro. Se as verdades novas deverão surgir primeiramente,
segundo os imperativos da lei natural, nos centros culturais do Velho Mundo, é
na pátria do Evangelho que lhes vamos dar a vida, aplicando-as na edificação
dos monumentos triunfais do Salvador… Alguns dos nossos auxiliares já se
encontram na Terra, esperando o toque de reunir de nossas falanges de
trabalhadores devotados, sob a direção compassiva e misericordiosa do Divino
Mestre.”
Houve na
alocução de Ismael um doce “stacato”.
Depois,
encaminhando-se para um dos dedicados e fiéis discípulos, falou-lhe
brandamente:
— “Descerás às
lutas terrestres com o objetivo de concentrar as nossas energias no país do
Cruzeiro, dirigindo-as para o alvo sagrado dos nossos esforços. Arregimentarás
todos os elementos dispersos com as dedicações do teu espírito, a fim de que
possamos criar o nosso núcleo de atividades espirituais, dentro dos elevados
propósitos de reforma e regeneração. Não precisamos encarecer aos teus olhos a
delicadeza de tua missão, mas com a plena observância do código de Jesus e com
a nossa assistência espiritual, pulverizarás todos os obstáculos, à força de
perseverança e de humildade, consolidando os primórdios da nossa obra, que é a
de Jesus, no seio da pátria do seu Evangelho… Se a luta vai ser grande,
considera que não será menor a compensação do Senhor, dele que é o caminho, a
verdade e a vida…”
Havia em toda
a assembleia espiritual um divino silêncio. O discípulo escolhido nada pudera
responder, com o coração alarmado por doces e esperançosas emoções, mas as
lágrimas de reconhecimento caíam-lhe copiosamente dos olhos.
Ismael
desfraldara a sua bandeira à luz gloriosa do Infinito, salientando-se a sua
inscrição divina, que parecia constituir-se de sóis infinitésimos. Uma vibração
de esperança e de fé palpitava em todos os corações, quando uma voz terna e
compassiva, exclamou das cúpulas radiosas do Ilimitado:
— “Glória a Deus nas Alturas e paz na Terra
aos trabalhadores de boa vontade!…”
Relâmpagos de
uma claridade estranha e misericordiosa clareavam o pensamento de quantos
presenciavam o maravilhoso espetáculo, enquanto uma chuva de aromas inundava a
atmosfera de perfumes balsâmicos e suavíssimos.
Sob aquela
bênção maravilhosa, a grande assembleia dos operários do Bem foi dissolvida.
Daí a algum
tempo, no dia 29 de agosto de 1831, no Riacho do Sangue, no Estado do Ceará,
nascia Adolfo Bezerra de Menezes, o grande discípulo de Ismael, que vinha
cumprir no Brasil uma grande missão.
Humberto de Campos — Brasil, coração do mundo, pátria
do Evangelho – Trecho do capítulo 22.