quinta-feira, 8 de abril de 2021

Imitação do Evangelho

 


Ségur, 9 de agosto de 1863 (Médium Sr. d’A...)


Nota – Eu a ninguém dera ciência do assunto do livro em que estava trabalhando.

Conservara-lhe de tal modo em segredo o título, que o editor, Sr. Didier, só o conheceu quando da impressão. Esse título foi, a princípio: Imitação do evangelho.

Mais tarde, por efeito de reiteradas observações do mesmo Sr. Didier e de algumas outras pessoas, mudei-o para o de O evangelho segundo o espiritismo. Assim, as reflexões contidas nas comunicações seguintes não podem ser tidas como fruto de ideias preconcebidas do médium.

 

Pergunta – Que pensais da nova obra em que trabalho neste momento?

Resposta – Esse livro de doutrina terá considerável influência, pois que explanas questões capitais, e não só o mundo religioso encontrará nele as máximas que lhe são necessárias, como também a vida prática das nações haurirá dele instruções excelentes. Fizeste bem enfrentando as questões de alta moral prática, do ponto de vista dos interesses gerais, dos interesses sociais e dos interesses religiosos. A dúvida tem que ser destruída; a terra e suas populações civilizadas estão prontas; já de há muito os teus amigos de além-túmulo as arrotearam; lança, pois, a semente que te confiamos, porque é tempo de que a Terra gravite na ordem irradiante das esferas e que saia, afinal, da penumbra e dos nevoeiros intelectuais. Acaba a tua obra e conta com a proteção do teu guia, guia de todos nós, e com o auxílio devotado dos Espíritos que te são mais fiéis e em cujo número digna-te de me incluir sempre.

 

P. – Que dirá o clero?

R. – O clero gritará — heresia —, porque verá que atacas decisivamente as penas eternas e outros pontos sobre os quais ele baseia a sua influência e o seu crédito. Gritará tanto mais, quanto se sentirá muito mais ferido do que com a publicação de O livro dos espíritos, cujos dados principais, a rigor, poderia aceitar. Agora, porém, tu entraste por um novo caminho, no qual não poderá ele acompanhar-te. O anátema secreto se tornará oficial e os espíritas serão repelidos, como o foram os judeus e os pagãos, pela Igreja Romana. Em compensação, os espíritas verão aumentar-se-lhes o número, em virtude dessa espécie de perseguição, sobretudo com o qualificarem, os padres, de demoníaca uma Doutrina cuja moralidade esplenderá como um raio de sol pela publicação mesma do teu novo livro e dos que se seguirão.

Aproxima-se a hora em que te será necessário apresentar o Espiritismo qual ele é, mostrando a todos onde se encontra a verdadeira doutrina ensinada pelo Cristo. Aproxima-se a hora em que, à face do céu e da Terra, terás de proclamar que o Espiritismo é a única tradição verdadeiramente cristã e a única instituição verdadeiramente divina e humana. Ao te escolherem, os Espíritos conheciam a solidez das tuas convicções e sabiam que a tua fé, qual muro de aço, resistiria a todos os ataques.

Entretanto, amigo, se a tua coragem ainda não desfaleceu sob a tarefa tão pesada que aceitaste, fica sabendo que foste feliz até o presente, mas que é chegada a hora das dificuldades. Sim, caro mestre, prepara-se a grande batalha; o fanatismo e a intolerância, exacerbados pelo bom êxito da tua propaganda, vão atacar-te e aos teus com armas envenenadas. Prepara-te para a luta. Tenho, porém, fé em ti, como tu tens fé em nós, e sei que a tua fé é das que transportam montanhas e fazem caminhar por sobre as águas. Coragem, pois, e que a tua obra se complete. Conta conosco e conta sobretudo com a grande alma do Mestre de todos nós, que te protege de modo muito particular.


 Paris, 14 de setembro de 1863 

Nota – Eu solicitara para mim uma comunicação sobre um assunto qualquer e pedira que ela me fosse enviada para o meu retiro de Sainte-Adresse.

“Quero falar-te de Paris, embora isso não me pareça de manifesta utilidade, uma vez que as minhas vozes íntimas se fazem ouvir em torno de ti e que teu cérebro percebe as nossas inspirações, com uma facilidade de que nem tu mesmo suspeitas. Nossa ação, principalmente a do Espírito Verdade, é constante ao teu derredor e tal que não a podes negar. Assim sendo, não entrarei em detalhes ociosos a respeito do plano de tua obra, plano que, segundo meus conselhos ocultos, modificaste tão ampla e completamente.

Compreendes agora por que precisávamos ter-te sob as mãos, livre de toda preocupação outra, que não a da Doutrina. Uma obra como a que elaboramos de comum acordo necessita de recolhimento e de insulamento sagrado. Tenho vivo interesse pelo teu trabalho, que é um passo considerável para a frente e abre, afinal, ao Espiritismo a estrada larga das aplicações proveitosas, a bem da sociedade. Com esta obra, o edifício começa a libertar-se dos andaimes e já se lhe pode ver a cúpula a desenhar-se no horizonte. Continua, pois, sem impaciência e sem fadiga; o monumento estará pronto na hora determinada.

Já tratamos contigo das questões incidentes do momento, isto é, das questões religiosas. O Espírito Verdade te falou das rebeliões que já se levantam na hora, presente. São necessárias essas hostilidades para manter desperta a atenção dos homens, que tão facilmente se deixam desviar de um assunto sério. Aos soldados que combatem pela causa, incessantemente se juntarão combatentes novos, cujas palavras e escritos hão de causar sensação e levarão a perturbação e a confusão às fileiras dos adversários.

Adeus, caro companheiro de antanho, discípulo fiel da verdade, que continua através da vida a obra a que outrora, diante do Espírito que te ama e a quem venero, juramos consagrar as nossas forças e as nossas existências, até que ela se achasse concluída. Saúdo-te.”

Observação – O plano da obra fora, de fato, completamente modificado, o que sem dúvida o médium não podia saber, pois que ele estava em Paris e eu em Sainte-Adresse. Tampouco podia saber que o Espírito Verdade me falara da atitude de revolta do bispo de Argélia e outros. Todas essas circunstâncias eram bem urdidas para me comprovar que os Espíritos tomavam parte em meus trabalhos.

Livro: Obras Póstumas

 15 de abril de 2021 – 157 anos de O Evangelho segundo o Espiritismo

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