(Pelo abade Poussin,
professor do Seminário de Nice)
(...) É verdade que o Espiritismo não
reconhece nos fenômenos psíquicos um caráter sobrenatural; ele os explica pelas
faculdades e pelos atributos da alma; e como a alma está na Natureza, os
considera como efeitos naturais, que se produzem em virtude de leis especiais, até
então desconhecidas, e que o Espiritismo dá a conhecer. Realizando-se esses
fenômenos aos nossos olhos, em condições idênticas, acompanhados das mesmas
circunstâncias e por intermédio de indivíduos que nada têm de excepcional, daí
conclui pela possibilidade dos que se passaram em tempos mais recuados, e isto
pela mesma causa natural.
O Espiritismo não se dirige às pessoas
convictas da existência desses fenômenos, e que são perfeitamente livres para
neles ver milagres, se tal é sua opinião, mas aos que os negam precisamente por
causa do caráter miraculoso que lhes querem dar.
Provando que esses fatos não têm de
sobrenatural senão a aparência, ele os faz aceitar pelos mesmos que os
repeliam. Os espíritas foram recrutados, em imensa maioria, entre os incrédulos
e, contudo, hoje não há um só que negue os fatos realizados pelo Cristo. Ora, o
que vale mais: crer na existência desses fatos, sem o sobrenatural, ou neles
não crer absolutamente? Os que os admitem a um título qualquer não estão mais
perto de vós do que os que os rejeitam completamente? Desde que o fato seja
admitido, não resta senão provar a sua fonte miraculosa, o que deve ser mais
fácil, se a fonte for real, do que quando o próprio fato é contestado. (...)
Como dissemos, o Espiritismo é
recrutado, em grande maioria, entre os incrédulos. Com efeito, perguntai aos
nove décimos dos adeptos, em que acreditavam antes de ser espíritas; eles
responderão que não acreditavam em nada ou, pelo menos, que duvidam de tudo;
para eles a existência da alma era uma hipótese, sem dúvida desejável, mas
incerta; a vida futura uma quimera; Cristo era um mito ou, no máximo, um
filósofo; Deus, se existisse, devia ser injusto, cruel e parcial, daí por que
tanto gostavam de crer que ele não existia.
Hoje creem e sua fé é inabalável,
porque assentada na evidência e na demonstração, e porque satisfaz à razão; o
futuro não é mais uma esperança, mas uma certeza, porque veem a vida espiritual
manifestar-se aos seus olhos; dela não duvidam mais do que duvidam do nascer do
Sol. É verdade que não creem nos demônios e nem nas chamas eternas do inferno,
mas, em compensação, acreditam firmemente num Deus soberanamente justo, bom e
misericordioso; não creem que o mal venha dele, que é a fonte de todo bem, nem
dos demônios, mas das próprias imperfeições do homem; que o homem se reforma e
o mal não existirá mais; vencer-se a si mesmo é vencer o demônio. Tal é a fé
dos espíritas, e a prova de sua força é que se esforçam por se tornarem
melhores, domarem suas inclinações más e porem em prática as máximas do Cristo,
olhando todos os homens como irmãos, sem acepção de raças, de castas, nem de
seitas, perdoando aos seus inimigos, retribuindo o mal com o bem, a exemplo do
divino modelo.
Sobre quem o Espiritismo devia ter mais
fácil acesso?
Não é sobre os que tinham fé e a quem
esta bastava, que nada pediam e de nada precisavam; mas sobre aqueles a quem
faltava a fé. Como o Cristo, foi aos doentes, e não aos que gozam de saúde; aos
que têm fome, e não aos que estão saciados. Ora, os doentes são os que se acham
torturados pelas angústias da dúvida e da incredulidade.
E que fez para os trazer a si? Uma
maciça propaganda? Indo pregar a doutrina nas praças públicas? Violentando
consciências? Absolutamente, porque estes são os meios da fraqueza; e se os
tivesse usado, teria mostrado que duvidava de sua força moral. Ele tem como
regra invariável, conforme a lei de caridade, ensinada pelo Cristo, não
constranger ninguém, respeitar todas as convicções; contentou-se em enunciar os
seus princípios, desenvolver em seus escritos as bases sobre as quais estão
assentadas as suas crenças, e deixou vir a ele os que quisessem. Se vieram
muitos, é que a muitos conveio e muitos nele acharam o que não haviam
encontrado alhures. Se recrutou principalmente entre os incrédulos, e se em
alguns anos enlaçou o mundo, é porque os incrédulos e os que não estão
satisfeitos com o que lhes dão são numerosos, desde que não se é atraído senão
para onde se encontra algo melhor do que o que se tem. Dissemos centenas de
vezes:
Querem combater o Espiritismo? Que deem
melhor que ele. (...)
Allan Kardec –
Excertos extraídos da Revista Espírita de janeiro/1868, rebatendo o livro "O Espiritismo diante da história e da igreja", de autoria do abade Poussin, que tem por objetivo refutar o Espiritismo.
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