(...) “uma
grande celebração cujas raízes repousam no judaísmo, mas que foram absorvidas
pelo mundo cristão, pelo Cristianismo e depois de certo modo, deturpadas e se
transformaram na celebração atual da páscoa, com seus coelhinhos, com seus ovos
da páscoa, e com uma festa que quase não guarda nenhuma relação com a páscoa
genuína.
O que é então
a páscoa?
A páscoa é uma
celebração judaica do momento em que o povo foi libertado da escravidão no
Egito.
É importante
salientar que quando nós falamos de páscoa, nós estamos num universo que é o da
religiosidade. Nós estamos no mundo religioso. E no universo da religiosidade
nós lidamos com símbolos, com metáforas. Por que isso? Porque religiosidade tem
a ver com o sentimento, e religiosidade tem a ver com a experiência pessoal,
com a experiência que a criatura faz de Deus, como ela experimenta Deus, como
ela experimenta a vida, como ela experimenta a si mesma diante da vida e diante
de Deus.
É óbvio que é
impossível traduzir uma experiência tão subjetiva, tão espiritualmente rica com
a linguagem da ciência, que é uma linguagem matemática, uma linguagem analítica;
ou com a linguagem da filosofia, que é uma linguagem especulativa, cheia de um
vocabulário complexo e às vezes até prolixo. Por essa razão, a religiosidade
opta pela linguagem da metáfora, que é quase uma linguagem dos sonhos. Uma
linguagem onírica e, portanto, a páscoa tem muito dessa simbologia onírica do
sonho.
O que diz a
páscoa?
Que o povo
hebreu estava escravo há 400 anos no Egito. O Egito foi invadido então por um
anjo da morte. Mas naquelas casas que tivessem uma marca de sangue de um
cordeiro, o anjo pularia aquela casa. Como o verbo pular em hebraico é pesah,
daí vem páscoa. A páscoa então é o pulo do anjo, o pulo que ele dá nas casas
que tem a marca do cordeiro, e que, portanto, foram poupados da tragédia de
perderem o filho mais velho da casa. Essa é a simbologia.
Por que o
cordeiro? E é interessante: na celebração da páscoa judaica o cordeiro ficava
uma semana com a família. Eles pegavam um cordeirinho e ele ficava dentro de
casa. Ali as crianças brincavam com o bichinho, criavam uma relação de afeto
com ele. Daí uma semana o animalzinho era quase que um membro da família,
então, ao entardecer da sexta-feira toda a família se reunia e o animal era
sacrificado. E tinha que ser assim, porque se alimentar do cordeiro da páscoa
precisava ser uma experiência de dor. É a experiência da perda de alguém amado,
então a páscoa tem a ver com essa experiência espiritual. A experiência da
libertação espiritual, mas que é uma experiência de desilusão, e você não se
desilude sem perder. Por isso esse choque do cordeirinho sendo imolado.
Com a vinda de
Jesus, o que ele faz? Ele convive três anos com seus discípulos; cura cegos;
cura paralíticos; janta todo dia na casinha de Simão Pedro; cura até mesmo a
sogra de Simão Pedro que morava com ele; trabalha com eles; acorda cedinho e
vai pescar com eles até o entardecer; convive com eles diariamente; participa
das suas dores; sofre as imperfeições de cada um deles; e no momento final dos
três anos, reúne os 12 e diz assim para eles: vocês vão me perder. Eu estou
agora me despedindo de vocês porque eu vou deixar o mundo corpóreo para voltar
ao mundo incorpóreo, e vocês vão experimentar uma tremenda tristeza, uma
profunda dor porque vocês criaram uma conexão emocional comigo. Eu não chamo
vocês mais de servos, eu chamo vocês de amigos porque tudo o que eu aprendi eu
compartilhei com vocês. Eu amei vocês da maneira maior que eu poderia amar; eu
amei tanto, que você Pedro, vai me negar, vai me trair, mas eu continuo te
amando e nada vai alterar o meu amor por você. Eu amo tanto você Judas, e mesmo
sabendo que você vai me trair, eu não estou te expulsando. Eu estou comendo com
você, e eu te perdoo, mas eu irei embora e vocês vão viver a maior experiência
de solidão, e de ascensão espiritual das suas vidas.
Mas o que eu
posso prometer? Que do mundo espiritual eu estarei junto com vocês. Vou
ampará-los em todas as suas atividades. Estarei eu mesmo do mundo espiritual
comandando a expansão do Cristianismo, portanto, essa crise da morte é apenas
um portal para a imortalidade porque a vida não cessa no túmulo, e toda vez que
vocês se sentirem solitários, toda vez que vocês sentirem falta da minha
amizade, do meu amor, da minha dedicação, da minha presença, vocês vão se
reunir, vão celebrar a páscoa em minha memória, em memória da minha amizade, em
memória do meu amor, e sobretudo, em memória da libertação de que eu sou o
mensageiro, porque Jesus veio libertar o homem da escravidão da matéria, da
escravidão dos sentidos.
Egito em
hebraico chama-se Mitsraim e Mitsraim em hebraico é estreiteza,
prisão. A matéria é opressora, os sentidos físicos são estreitos. A mensagem de
Jesus é libertadora porque ela vem trazer um amor incondicional, um amor que
ama independente de... Portanto, é um amor que liberta, então ele recomenda:
reúnam-se para celebrarem a páscoa, para celebrar o amor, para celebrar a minha
dedicação, e para celebrar a imortalidade da alma, a vida espiritual.
Mas
infelizmente os séculos passaram, e nós transformamos a páscoa em coelhos e
ovinhos coloridos de chocolate, apagando completamente a dimensão espiritual e
a experiência religiosa que a páscoa propõe, que é uma experiência de Deus, é
uma experiência de solidão, é uma experiência de amar e de se sentir amado, não
importam as circunstâncias.
Essa é a páscoa!”
Haroldo Dutra
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